domingo, 3 de dezembro de 2017

Assassinato no Expresso do Oriente: elenco soberbo

Por Dora Carvalho

Poucos diretores têm a chance de reunir em um único longa um elenco estrelado como o de Assassinato no Expresso do Oriente. A adaptação do romance da escritora inglesa Agatha Christie desta vez é dirigida por Kenneth Branagh, que também faz o famoso detetive belga Hercule Poirot.
Esta é a segunda mais importante adaptação do livro para a tela grande. A primeira, de 1974, e dirigida por Sidney Lumet, também reunia nomes estrelados como Lauren Bacall, Sean Connery, Vanessa Redgrave, Jacqueline Bisset e Anthony Perkins.
Branagh, nesta versão, conseguiu reunir Michelle Pfeiffer, Johnny Depp, Daisy Ridley (a atriz sensação do momento de Star Wars), Penelope Cruz, Willem Defoe e Judi Dench. Nada menos que perfeitos em seus papéis, já que o texto exigia deles um grau de dissimulação, própria dos romances de Agatha Christie, para ludibriar o expectador.
O livro Assassinato no Expresso do Oriente foi publicado em 1934 por Agatha Christie e só no primeiro ano de lançamento vendeu 3 milhões de cópias. Na maior parte das listas dos melhores livros da escritora, figura em primeiro lugar na preferência dos fãs. Agatha Christie é uma das mais importantes escritoras do gênero policial e as adaptações das obras, seja para o teatro ou para as telas (TV e cinema) sempre é garantia de sucesso.
Não à toa, criou-se uma grande expectativa em torno do filme, ainda mais com a direção de Branagh. E não decepciona, já que o diretor costuma ser fiel às obras literárias nas diversas adaptações que dirigiu e atuou ao longo da carreira. Com um custo de US$ 55 milhões, o longa ja faturou US$ 200 milhões desde a estreia.
O enredo é bem típico das obras da Agatha Christie. Em uma longa viagem de trem a partir de Istambul, o trem de luxo Expresso do Oriente, parte da capital turca com destino a Londres e, no vagão da primeira classe, um assassinato assusta os nobres viajantes. O famoso detetive belga Hercule Poirot fica então encarregado de desvendar o caso. A face nobre dos ocupantes do luxuoso vagão começa a cair e o expectador mergulha na mente do detetive para descobrir o culpado.
O que se destaca no filme é a produção esmerada. Desde as primeiras cenas em Jerusalém, com uma fotografia explêndida, até às cenas nas montanhas geladas, por onde percorre o expresso, e a elegância das ambientações do antigo trem.

É um filme correto, bem executado e puro entretenimento, principalmente para quem está buscando algo além de pancadaria, explosões e filmes de super-heróis. E o melhor: um clássico detetive de dramas policiais, com um toque de humor e um jeito sabichão.




domingo, 8 de outubro de 2017

Blader Runner – 2049 fecha o ano do sci-fi

 Por Dora Carvalho


Quando ouvimos que um diretor pretende trazer de volta um sucesso do cinema do passado, a tendência é a desconfiança. Não foi diferente com Blade Runner – 2049, assim que os primeiros rumores sobre as filmagens começaram a pipocar aqui e ali. Mas, ao saber que a direção ficaria com Denis Villeneuve e que o produtor seria Ridley Scott, as expectativas do renascimento de um grande clássico do cinema só aumentaram.
Blade Runner – O caçador de andróides (1982) é o ponto de partida para uma safra de filmes de ficção científica em que a luta entre o bem e o mal começa a ficar em segundo plano em filmes do gênero e as discussões giram em torno sobre o que deu de tão errado no sonho do super desenvolvimento humano; a tecnologia não é mais aliada da humanidade, ao contrário, torna-se um reflexo da decadência de uma sociedade. Dirigido por Ridley Scott, quando estreou nos cinemas, foi pouco compreendido e um fracasso de bilheteria nos Estados Unidos. Há muita polêmica em torno do filme, já que à epoca os estudios quiseram amenizar aspectos mais densos do filme e mudaram até cortes e as cores de algumas cenas. Só em 1992, Scott lançou o DVD com “a versão do diretor” e, em 2005, foi lançada uma caixa com quatro versões do longa, incluindo a apresentada em festivais. O fato é que Blade Runner, aos poucos, foi ganhando contornos de filme cult e hoje é considerado um dos melhores do gênero sci-fi.
Baseado no romance “Andróides sonham com ovelhas elétricas”, de Philip K. Dick, publicado originalmente em 1968, portanto, prestes a completar 50 anos, contempla alguns aspectos do enredo do livro. O filme tem no elenco Harrison Ford, que fazia o detetive Deckard, encarregado de caçar e “aposentar” quatro andróides desertores, os chamados Replicantes, de uma geração de robôs chamada de Nexus 6. Após uma rebelião, esses robôs começaram a ser eliminados. O único objetivo dessas criaturas sofisticadas e a mais próxima possível de um ser humano era ter mais tempo de vida. A atriz Daryl Hannah e o ator Hutger Hauer eram a personificação dessa beleza e perfeição robótica. Hauer faz uma das cenas mais lindas e filosóficas do cinema ao final do filme.
Mas por quê Blade Runner agora é considerado um filme tão bom? Para a época, não era comum a mistura de gêneros estéticos a que Ridley Scott se propôs: o longa tem um aspecto retrofuturista. Apesar de ser ambientado em 2019, a estética adotada era dos filmes noir. É uma mistura de toda ambientação futurista – prédios, luzes, anúncios holográficos e luminosos que lembra Shibuya, bairro de Tóquio, com um clima anos 50 – chuva constante (no caso aqui, chuva ácida, devido à poluição), figurino de Sean Young, par romântico de Harrison Ford, um detetive decadente e bem característico do gênero noir, e um certo sentimento de Guerra Fria que ainda pairava no mundo no início dos anos 80.  É uma mistura difícil de ser compreendida naquele momento, mas que deu origem a outras obras do tipo e, aos poucos, o público foi percebendo a grandeza do filme. E ainda tinha a belíssima trilha sonora assinada por Vangelis, absolutamente inesquecível.
E agora, onde Denis Villeneuve acertou? Em primeiro lugar, em não tentar fazer um remake ou reboot do original. Ao contrário, tenta explorar outros aspectos do romance de Philip K. Dick que não foram contemplados no primeiro filme. Mas teve a inteligência de não desagradar os fãs do filme de 1982, utilizando-se de diversas referências ao longa de Ridley Scott, para homenagear e ao mesmo tempo contextualizar o espectador. Villeneuve foi sutil em colocar sua própria assinatura e quem acompanha outros trabalhos do diretor logo vai perceber isso. Dá para perceber os planos super abertos, a grandiosidade das tomadas que se alternam com o foco fechado no rosto dos atores. Outro ponto positivo foi o fato de o diretor evitar o didatismo e excesso de explicações para quem não assistiu o primeiro filme. Isso torna o longa único para quem tem acesso ao enredo pela primeira vez. Mas, sobretudo, por também não ser um filme que só se utiliza de efeitos especiais. Fica evidente que a tecnologia cinematográfica é utilizada para torná-la uma intensa experiência estética de cinema e o espectador sai da sala sabendo que viu um filme marcante.
Ryan Gosling e Robin Wright estão bem no filme, mas é lógico que a aparição do próprio Harrison Ford dá uma reviravolta na história e a trama se torna mais intensa até o ápice. Duas coisas que faltaram: talvez um vilão mais contundente – Jared Leto, embora ótimo, talvez tenha ficado mais com ares de Jedi do que de vilão. E, para quem viu o primeiro filme, há uma certa expectativa de um final apoteótico. O cuidado de Villeneuve em todo 2049 não resultou em um final surpreendente. Mas o filme surpreende sim por todo o conjunto e merece ser visto na tela grande. Um dos poucos que vale sim assistir em 3D.

Denis Villeneuve acertou em cheio com o filme “A chegada”, um dos melhores de ficção científica do ano. E termina 2017 com outro grande êxito. É para ficar de olho nesse diretor, que promete, até o momento, ser um dos grandes.




domingo, 30 de julho de 2017

Outlander: surpresas na segunda temporada

Por Dora Carvalho

A série de livros Outlander tem fãs devotos em todo o mundo. A autora Diana Gabaldon já vendeu cerca de 20 milhões de exemplares da saga. Os leitores acompanham as aventuras da protagonista Claire Fraser, uma enfermeira de guerra do século 20 que viaja no tempo 200 anos e se depara com uma revolta dos clãs das Terras Altas escocesas, que reinvidicavam o trono para a Casa de Stuart.
Tanto sucesso para os livros motivou o canal norte-americano Starz a adaptar a série para a TV, com sucesso expressivo para a primeira temporada (que eu já falei aqui), que conta o enredo do primeiro volume da saga. A segunda acaba de estrear no Brasil para os assinantes do Netflix, Claro Vídeo e Fox Play.
O lançamento por aqui coincide com o burburinho causado pelos produtores do show na San Diego Comic Con 2017, com a apresentação do trailer e fotos da terceira temporada.
Quando estreou nos Estados Unidos, em abril do ano passado, a segunda temporada de Outlander bateu todos os recordes de audiência do canal Starz para o retorno de uma série, com cerca de 1,46 milhão de espectadores. O público, principalmente o feminino, parece se identificar com as aventuras do casal protagonista Claire e Jamie Fraser, vividos, respectivamente, por Caitriona Balfe e Sam Heughan, cujos personagens e interpretações crescem muito com o desenvolvimento do roteiro para a TV. A mudança de ambiente da trama – da Escócia para a França em alguns episódios – também agradou o público e deu um tom que flutua entre a revolução e intrigas da corte. 
Mais uma vez, são 13 episódios de cerca de 1 hora cada um. O último ganhou um especial de quase 1h30m.
Se o drama da primeira etapa era o desafio de uma mulher do século 20 se adaptar aos costumes de 1743, na segunda, muito mais segura de si, temos Claire Fraiser envolvida em política e guerra entre os anos de 1745 e 1746. A personagem tem de superar os traumas de ter vivido a Segunda Guerra Mundial e a possibilidade de evitar uma outra grande batalha. Mas, como todas as histórias que envolvem viagem no tempo, será que mexer com os fatos e acontecimentos de uma época podem salvar aqueles que ama ou ter consequências desastrosas no futuro?
O roteiro da segunda temporada é fantástico e é assinado por Ronald D. Moore, que continua à frente da produção nas duas próximas temporadas. A terceira estreia em 10 de setembro nos EUA. É possível que a consultoria da própria Diana Gabaldon esteja ajudando a manter o ritmo vibrante do enredo, sem uma preocupação tão restrita com a fidelidade dos livros. É um produto essencialmente para TV e para emocionar os fãs que podem ver materializados na tela toda a riqueza histórica do romance da escritora. Uma característica interessante é a maneira como os roteiristas conseguem aproveitar a participação de todos os personagens ao longo do tempo histórico da trama, provocando surpresas nos espectadores. E o mais importante é a versatilidade desses atores para interpretar diferentes características dos personagens, mas, aos mesmo tempo, provocar lembrança na audiência sobre quem de fato é a referência – se alguém do século 20 ou do século 18.

Outlander é, sem dúvida, uma série para quem gosta de enredos de época com fundo histórico. E a segunda temporada está imperdível.





sábado, 15 de julho de 2017

Homem-Aranha: de volta aos anos 80

Quem era fã dos filmes adolescentes dos anos 80, como Curtindo a vida adoidado (1986) e Clube dos Cinco (1985), vai perceber claras referências neste reboot de Homem-Aranha – De volta ao lar. E os fãs insatisfeitos com os últimos longas do herói podem ser reconquistados por uma trama muito mais ligada aos quadrinhos e com o quebra-cabeça formado pelo universo cinematográfico da Marvel, que começou em 2008 e serve de introdução para o próximo Vingadores Guerra Infinita, cuja estreia está prevista para abril do ano que vem.
Tom Holland, o novo astro da trama, é o elemento-chave dessa reconquista, por parecer e atuar de uma maneira que lembra muito os enredos adolescentes da década de 80.
O reboot mostra Peter Parker na escola, com 14 anos, às voltas dos problemas adolescentes, a busca por aprovação dos colegas, paqueras, e as missões mirabolantes do time dos Vingadores e o amadurecimento do Homem-Aranha como super-herói. Assim como os personagens dos filmes dos anos 80, Parker sempre se dá mal até encontrar um plano para tirá-lo das enrascadas e a graça está no fato de que é o garoto Peter Parker que tem que encontrar a solução e não os poderes de sua face Homem-Aranha. Talvez este seja o ponto que os fãs mais entusiastas do herói possam criticar no filme e já há um burburinho nesse sentido. Mas a escolha dos roteiristas por esse caminho abre espaço para novas tramas, sem dúvida muito mais independente de uma conexão com os Vingadores.
O filme, dirigido por Jon Watts e uma co-produção entre a Marvel Studios e a Sony Pictures, é leve, cheio de ação para quem gosta de toda pirotecnica do gênero mas, graças ao carisma de Tom Holland, mantém a nostalgia das tramas dos anos 80, que vem sendo resgatada tanto em filmes como em séries de TV (como é o caso de Stranger Things). Aliás, a escalação do elenco é o ponto alto do filme. Na órbita de Peter Parker, está o amigo Ned (interpretado pelo excelente Jacob Batalon), um nerd típico que se encanta diante da ideia de ter um amigo super-herói e garante boas risadas para o público. Jon Favreu volta como Happy Hogan e o mau humor típico do personagem. Michael Keaton surge na trama como o vilão Abutre e mostra o submundo que surgiu a partir da ascenção dos Vingadores. Robert Downey Jr aparece de leve no filme, o destaque mesmo são para os personagens comuns que estão em torno do Peter Parker, como é o caso de Marisa Tomei, que vive uma Tia May moderninha.
A trilha sonora também resgata versões dos Ramones como Spider-Man e Blitzkrieg Bop com o inconfundível refrão “Hey-Ho Let’s Go” e dão o gás necessário para o filme. Um breve trecho de Can’t your hear me knocking, dos Rolling Stones, apresenta o vilão Abutre.
O garoto magricela com jeitão mais de anti-herói atrapalhado está muito mais para a realidade da molecada de hoje do que para o universo mágico de Os Vingadores. O sucesso nas bilheterias comprova isso. O longa já ultrapassou a marca dos 300 milhões de dólares em todo o mundo.

P.S. Não deixe de ver os créditos até o final. 




sábado, 8 de julho de 2017

Férias, frio e Sherlock

Por Dora Carvalho


Com tantas estreias de cinema e séries, ficou difícil colocar em dia todas as novidades. O mês de julho então fica oficialmente declarado o período das maratonas. E o início foi auspicioso, porque finalmente consegui assistir a quarta temporada de Sherlock.
O sucesso das temporadas anteriores, definitivamente, foi apenas mais combustível para os produtores Steven Moffat e Mark Gatiss tornarem a trama ainda mais genial.
Quando imaginamos que a produção da BBC poderia perder um pouco o fôlego, ainda mais por ter pausas tão longas entre uma temporada e outra, a quarta fase de Sherlock nos surpreende com um roteiro ainda mais veloz, experimental e que rompe com tudo aquilo que pode-se imaginar para uma produção de TV – roteiro não linear, cenas de flashback e passagens de tempo que o espectador mais desavisado pode até pensar que a trama está querendo fazer alguma espécie de pegadinha com os fãs. Afinal, o que de fato aconteceu com Moriarty? Os produtores desconversam, mas a todo momento a trama ensaia uma reviravolta na conclusão da história do maior inimigo de Sherlock. Será que ele volta para a trama? Mas, não importa. O roteiro é tão sensacional que de alguma maneira Moriarty nos assombra.
Mais uma vez, são três episódios de cerca de 1h30 cada: As seis Thatchers, O detetive mentiroso e O problema final.
Benedict Cumberbatch (Sherlock) desta vez tem que lidar não apenas com a solução das investigações, mas com os próprios monstros pessoais e a insatisfação dos amigos mais próximos com o comportamento sempre arredio do detetive. John Watson e Mycroft Holmes são os mais afetados pelos delírios de Sherlock. Mas o destaque mesmo é a participação das personagens femininas na série. Paro por aqui, porque o resto seria spoiler.
A trama também começa a desvendar alguns mistérios lançados em episódios anteriores, entretanto, apresenta outros enigmas, o que pode até sugerir uma quinta temporada. Os produtores, porém, são evasivos em relação a isso e, em diversas entrevistas, ora dizem que a série chegou ao final ora indicam que novos episódios poderão ser rodados. Filmes especiais também não foram descartados.
O fato é que uma série tão boa e que cativa fãs ao redor do mundo não pode acabar tão cedo, porque enredo para continuar não falta. Sherlock é a série do Netflix com maior número de espectadores, segundo o site Sherlock Brasil, seguida da série Friends, uma produção dos anos 90.

Só a vontade dos produtores rodarem outros formatos é que pode colocar fim em Sherlock. Há uma clara intenção de criar uma série que tenha como inspiração Drácula, de Bram Stoker. Só não se sabe ainda se algo de época ou com os moldes contemporâneos, como aconteceu com Sherlock. A notícia causou alvoroço e a expectativa de concretização só aumenta. Seja Sherlock ou Drácula, para os fãs, só resta esperar.  


sexta-feira, 19 de maio de 2017

Os pôsteres mais icônicos da história do cinema

Por Dora Carvalho

Imagens inesquecíveis, que capturam o espírito do filme, fazem mistério, mas ao mesmo tempo criam grande expectativa em torno do enredo. Os pôsteres de cinema antigo são, sem dúvida, obras artísticas que homenageiam atores, atrizes, nos lembram de trilhas sonoras marcantes, independentemente do gênero cinematográfico. 
Nesses dois anos do blog +CineLivre, uma homenagem a alguns filmes e atores históricos através de imagens fabulosas. 

Casablanca (1942)


Cantando na Chuva (1952)


E o vento levou (1939)


Bonequinha de luxo (1961)


Vertigo (1958)



Metropolis (1927)


O poderoso chefão (1972)


Star Wars (1977)


Scarface (1983)


Laranja Mecânica (1971)


Extra-Terrestre (1982)


Amadeus (1984)


2001 - Uma odisséia no espaço (1968)


Batman (1989)


Blade Runner (1982)


Caça-fantasmas (1984)


Tubarão (1975)



Cães de Aluguel (1992)


Jurassic Park (1993)


O silêncio dos inocentes (1991)



O exorcista (1973)


Pulp Fiction (1994)


Rocky (1976)


Indiana Jones - Os caçadores da arca perdida (1981)


 Este site disponibiliza pôsteres com imagens em alta resolução: 
http://forum.blu-ray.com/showthread.php?t=220892

domingo, 2 de abril de 2017

Vigilante do Amanhã: o cyberpunk está de volta

Por Dora Carvalho


Em 1985, o escritor norte-americano William Gibson lançou a obra Neuromancer, considerada um marco do surgimento do termo e estética cyberpunk. O livro retrata um futuro próximo em que a sociedade é dominada por grandes corporações e os humanos têm partes do corpo aperfeiçoadas com a robótica. Poucos anos depois, entre 1989 e 1991, o artista japonês de mangás, Masamune Shirow, publicou Ghost in the Shell, inspirado em Gibson. O enredo se passa em 2029 e apresenta uma sociedade em que os humanos acessam redes de informações com os cyber-cérebros. Qualquer dano ou insatisfação corporais são reparados com substituições cibernéticas. A protagonista é a Major Motoko Kusanagi, cuja única condição humana está no “salvamento” do cérebro da personagem, que foi implantado em um corpo robô.
Ghost in the Shell é um sucesso entre os fãs de mangás e animes. A sofisticação do enredo, dos traços do mangá e das adaptações para televisão e games arregimentou uma grande legião de fãs não apenas no Japão como em todo mundo. A notícia da adaptação para uma live-action na telona gerou bastante expectativa de quanto os produtores e diretores seriam fiéis à obra original, sobretudo, no que diz respeito às discussões filosóficas sobre a existência humana e os limites tecnológicos. Como Matrix (1999) também teve como uma das inspirações Ghost in the Shell, fãs do gênero esperavam uma espécie de revival. 
O longa A vigilante do amanhã – título dado à história aqui no Brasil e que acaba de estrear - é dirigido pelo diretor pouco conhecido Rupert Sanders (Branca de Neve e o Caçador /2012).
É claro que os fãs mais ardorosos tanto do mangá quanto do anime terão pontos de insatisfação. Visto a partir das referências as quais o filme se inspira, o enredo cinematográfico é uma espécie de introdução ao universo de Ghost in the Shell.
Mas quem está interessado nas diversas referências que servem de inspiração para o filme, assim como as cenas de ação e efeitos visuais, pode sair da sala de cinema querendo saber mais. E quem é fã da estética cyberpunk e, principalmente de Neuromancer e Reconhecimento de padrões de William Gibson, vai identificar no enredo e nas cenas de ação diálogos e diversas passagens descritas nos dois romances do escritor norte-americano. Gibson praticamente profetizou os avanços tecnológicos contemporâneos e como isso tudo é encantador e ao mesmo tempo nocivo, quando o excesso de tecnologia vai tomando conta de nossas vidas. 
Sem dúvida alguma, o enredo distópico de A vigilante do amanhã toca nesses pontos. O estranhamento inicial em relação à escalação de Scarlett Johansson como protagonista – houve certa polêmica por ela ser ocidental – se desfaz nos primeiros minutos, já que o enredo trata de uma sociedade altamente globalizada, sem distinção de países e múltiplas nacionalidades. Quem já leu livros cyberpunks sabe que esse tipo de distinção entre povos é praticamente inexistente, já que a tecnologia acessa tudo e a todos. 
O fato é que Johansson está bem na pele da Major Motoko, a atriz transmite muita empatia em relação à personagem, transferindo a discussão filosófica da história original para um contexto mais intimista, além, é claro, de protagonizar as melhores cenas de ação do filme. Major é líder de uma equipe de agentes do Setor 9, grupo especializado em terrorismo cibernético. O ator dinamarquês Pilou Asbœk é Batou, um agente de olhos de raio-x que acompanha Matoko nas missões, assim como Togusa (Chin Han), um atirador que não aceita melhorias tecnológicas no corpo. O chefe do setor é Daisuke Aramaki, vivido pelo ator japonês Takeshi Kitano, referência no universo da cultura pop japonesa. Os diretores deram a satisfação aos espectadores de deixá-lo falando somente em japonês. Juliette Binoche faz a doutora Ouelet, responsável pelo projeto que criou a robô Major. É através dela que surge um pouco da discussão dos limites entre humanos e robôs.

O que fica de A vigilante do amanhã é um desejo de ler e assistir cada vez mais obras relacionadas ao universo cyberpunk. Dois elementos do filme o tornam uma homenagem a esse estilo de ficção científica: a trilha sonora fiel ao anime japonês, com obras que vão de Mozart a Debussy, passando por música eletrônica japonesa e a fotografia absolutamente inspirada no cinema noir, com referência direta à Blade Runner. As cenas holográficas deixam isso evidente.






A sequência de abertura do filme é muito fiel a do anime. Veja abaixo:




sábado, 4 de fevereiro de 2017

Estrelas além do tempo ou figuras escondidas

Por Dora Carvalho

A história por trás do filme Estrelas além do tempo é por si só e incrível e fascinante. Três mulheres afro-americanas foram responsáveis por parte dos cálculos e preparativos para levar os americanos à dianteira em uma das maiores disputas do período da Guerra Fria entre Estados Unidos e Rússia: a corrida espacial. Enquanto os russos tinham Yuri Gagarin fazendo o primeiro vôo na órbita terrestre, os americanos se debatiam com uma série de erros e fracassos, colocando em risco a existência da NASA.
Margot Lee Shetterly, autora do livro Hidden Figures (ou figuras escondidas), ainda estava pesquisando em 2014 a história das mulheres que eram “computadores”, quando foi convidada a participar do roteiro de um filme que ganharia o mesmo título. Até o início da década de 60, computadores eram pessoas que faziam os cálculos matemáticos necessários para a execução de projetos da NASA. A Segunda Guerra Mundial e o período da Guerra Fria (a tensa disputa por hegemonia entre EUA e Rússia) fizeram com que o governo norte-americano recrutasse centenas de profissionais da área de matemática e engenharia. Por essa razão, a população afro do país começou a ocupar, ainda que de forma tímida, postos de trabalho no serviço público. Katherine Globe, Mary Jackson e Dorothy Vaughan era um desses “computadores”. Apesar do conhecimento e sólida formação acadêmica, se deparavam com severas limitações sociais em razão da segregação de pessoas: não podiam frequentar os mesmos locais que a população de cor branca, escolas, estabelecimentos públicos e, mesmo assim, foram pioneiras em suas áreas, lutando com as armas que tinham contra o preconceito. Eram mães, esposas e trabalhadoras em busca de dignidade para suas famílias e ascensão pessoal e social.
Em departamentos dominados por figuras masculinas no início dos anos 60, as três conseguiram feitos gigantescos para a época: conseguiram não só serem ouvidas, mas também puderam contribuir com a pesquisa científica e evolução do conhecimento.
Só que, como o título em inglês do livro nos apresenta, eram figuras escondidas. Os nomes dessas mulheres até muito pouco tempo atrás eram quase desconhecidos nos meios acadêmicos e científicos. Até que Margot Lee Shetterly iniciasse a pesquisa dessa história que logo ganhou destaque com a compra dos direitos de adaptação para o cinema.
É difícil definir o que é melhor neste filme, já que uma história tão interessante não ofereceu dificuldades para o diretor Theodore Melfi (ainda sem grandes títulos no currículo) transpor para as telas uma narrativa tão instigante. Mas ele fez mais. Colocou no elenco três gigantes: Octavia Spencer (que faz Dorothy Vaughan), Janelle Monáe (cantora estreante como atriz e já surpreendeu) e Taraji P. Henson, que está arrasando no papel da matemática Katherine Globe e, sem dúvida, conduz o filme, tamanha a força da interpretação. O longa tem ainda Kevin Kostner, Kirsten Dunst e Jim Parsons (o eterno Sheldon Cooper de “The Big Band Theory) que funcionam como um excelente elenco de apoio para fazer as três atrizes brilharem ainda mais.
O filme Estrelas além do tempo não tem grandes inovações cinematográficas, mas se agiganta com as atuações, a perfeita recriação de época, seja no figurino e cenários e, finalmente, pelas discussões que suscita. Apesar do excesso de indicações de La la Land – Cantando estações, ficarei na torcida para que a força da história de vida de três mulheres notáveis ganhe ainda mais destaque. O longa concorre a três premiações: Oscar de melhor roteiro adaptado, atriz coadjuvante para Octavia Spencer e de melhor filme. É possível que a atriz traga a estatueta para o filme.

Recomendo muitíssimo a leitura do livro, que traz com riqueza de detalhes como era o dia a dia da NASA nas décadas iniciais, quando era chamada de NACA, assim como a vida dos trabalhadores do primeiro centro de computação do complexo de pesquisa espacial. O filme é inspirado na história escrita pela autora, com mais destaque para o feito dessas três mulheres. Este é um raro caso em que livro e filme se complementam, já que foram produzidos quase que ao mesmo tempo e ambos são muito bons. Vale a leitura antes ou após o filme.






Estrelas além do tempo - Margot Lee Shetterly - Editora HarperCollins (2017)

terça-feira, 24 de janeiro de 2017

Rita, a professora que todos gostariam de ter

Por Vilma Pavani

Ela é agressiva, até meio grossa às vezes, mal resolvida em seus relacionamentos  – tanto pessoais como profissionais – fuma feito uma chaminé, não gosta de ser criticada e toma decisões impulsivamente, o que a leva a cometer vários erros. Mas também é inteligente, perspicaz, leal aos amigos e, em especial, aos seus alunos, com os quais se compromete profundamente. Essa é Rita, a professora politicamente  incorreta da série dinamarquesa de mesmo nome. A série foi lançada em 2012 pelo canal dinamarquês TV2 e fez o maior sucesso no país. Ao mesmo tempo, tornou-se uma das produções estrangeiras mais populares entre os assinantes americanos do Netflix, e por conta disso o site de streaming decidiu ser o coprodutor da terceira temporada. Sem o Netflix provavelmente a série seria encerrada na segunda temporada, o que de todo modo não lhe tiraria os méritos e nem o sentido. Mas é tão boa de ver que valeria até continuar uma temporada mais.
A personagem central é Rita Madsen (Mille Dinesen, ótima na pele da personagem), uma professora de escola primária que luta para criar sozinha seus três filhos adolescentes e para quebrar a burocracia do sistema escolar. É interessante notar que apesar de se passar em Copenhague e com todas as enormes diferenças culturais e econômicas, os problemas enfrentados na escola têm muito em comum com qualquer escola de qualquer país, como a desmotivação de parte dos alunos, o bullying entre colegas e sobre os professores, gravidez adolescente, homossexualidade, preconceito de classes e contra imigrantes, drogas etc. E embora Rita seja de longe a pessoa mais interessante da série, vários personagens crescem e se sobressaem ao longo dos episódios, como a idealista e inexperiente professora Hjordis ou Jeppe, o filho mais jovem e gay de Rita.
Ora engraçada, ora séria, ora pungente, a história se desenrola com facilidade e em dois ou três capítulos a gente se deixa seduzir por ela.  E Rita, sem dúvida, com todos os seus erros e acertos, é a professora que gostaríamos de ser, ou de ter  tido, ou que cuidasse de nossos filhos. Vale a pena assistir.



 A série tem três temporadas e um total de 24 episódios. Foi criada por Christian Torpe.

sábado, 21 de janeiro de 2017

The OA: estranheza e sensibilidade

Por Dora Carvalho


Após sete anos desaparecida, a jovem Prairie reaparece em um video compartilhado pela internet. A volta gera ainda mais mistério, já que a protagonista da história ressurge com novas e inexplicáveis capacidades físicas. Esse é o ponto de partida de The OA, uma das mais surpreendentes séries lançadas recentemente pelo Netflix.
A primeira temporada tem oito episódios que vai desenrolando a trama de mistério de maneira a prender o espectador de tal forma que fica impossível não assistir a série em maratona. Cada fim de episódio gera uma nova pergunta e ainda mais mistérios.
Brit Marling (Prairie), além de protagonizar The OA, é responsável pelo roteiro e produção. A interpretação da atriz é sem dúvida o maior destaque da trama e uma surpresa. A sensibilidade da direção de Zal Batmanglij se une a uma construção muito bem feita dos personagens, que vão revelando seus dramas sem a necessidade de muitas explicações. Tudo é a partir do ponto de vista da protagonista, entretanto, o enredo se torna de certa forma caleidoscópico porque há conexão entre acontecimentos do passado e futuro e os personagens, apesar de muito diferentes entre si, vão ganhando ressonância.
Ao assistir, o espectador pode tentar enquadrar The OA em algum gênero, mas a trama reúne mistério, ficção científica e discussões de filosofia e dramas existenciais. Aliás, tentar classificar a trama é inútil, pois a proposta é realmente causar estranheza.
Os serviços de streaming, com uma variada gama de produções próprias, abriram a possibilidade de atores, produtores e diretores oferecerem enredos sem muita preocupação com grades de horário e faixas etária de público, afinal, quem define tudo isso são os assinantes. Não à toa, vemos séries como Stranger Things, que fazem referência aos anos 80 e Steven Spielberg, conquistar o público. Se fosse para reverenciar algum diretor da velha guarda, The OA estaria mais próxima da estranheza provocada por Twin Peaks (1990/1991) de David Linch, que, é bom lembrar, terá continuação neste ano.
The OA, que também tem a assinatura de produção de Brad Pitt e já tem segunda temporada definida, é uma série para experimentações televisivas, de ampliação das possibilidades estéticas para a TV e o público tem a oportunidade de assistir com calma uma produção com a sensibilidade do cinema, mas com a reflexão necessária de um livro. Mas daqueles que a gente só larga quando lê a última página.